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Entrevista sobre comunicação e CNV

  • Foto do escritor: Danielle Câmara
    Danielle Câmara
  • 9 de ago. de 2020
  • 5 min de leitura

Em entrevista à Melina Monteiro, psicóloga de uma multinacional de petróleo e gás japonesa, no dia 29/07/2020, Danielle Câmara falou sobre comunicação e o uso da CNV (comunicação não-violenta) para nos comunicarmos melhor.


Leia a seguir a íntegra da entrevista:


Melina: Acho que vale a pena, antes de entrar em CNV, uma pergunta sobre COMUNICAÇÃO. Afinal, como saber se estamos nos comunicando bem?


Danielle: Entre o que é dito e o que é compreendido, há uma longa distância. Pode haver muito ruído na interlocução. A boa comunicação contribui para aproximar as pessoas e trazer bons relacionamentos, envolve inteligência emocional. A comunicação não deve apenas ser tecnicamente adequada, mas repleta de conteúdo e emoção. Um bom comunicador é assertivo e bem compreendido. Ele tem o hábito de checar se as informações recebidas pelo interlocutor estão compatíveis com o que foi dito. Ele sabe ouvir e usa bem sua expressividade corporal como complemento indissociável da fala.


Melina: Estamos ouvindo muito de CNV, mas, para garantirmos que todos estamos na mesma página, você pode explicar para nós o que é CNV e como ela é importante no dia a dia (como ela pode ser usada)?


Danielle: Muitas vezes a pessoa não se reconhece violenta porque não explode ou grita. Violento pode ser ignorar o que sente, quando não ouvimos a voz, lá dentro, dizendo que está na hora de olhar para certas coisas na vida. Aprender a “escutar” de fato.


Mesmo quem não sabe nada sobre CNV, dará um grande passo desenvolvendo a escuta, respirando, não interrompendo ou querendo achar soluções mágicas e milagrosas para os impasses.


A CNV, desenvolvida por Marshall Rosenberg, nos EUA dos anos 60, surgiu com o intuito de compreender por que algumas pessoas reagiam de maneira violenta e outras eram compassivas. Foi estruturada como uma forma de comunicação que privilegia a autenticidade e a empatia.


Melina: Falando da CNV, como você vê a importância de conhecer este conceito dentro de casa? E nas relações empresariais?


Danielle: A CNV é excelente para os relacionamentos e isso vai se manifestar em todos os níveis: no trabalho, nos relacionamentos afetivos, com os filhos... ajuda a permitir um fluxo melhor de informações, reduz mal entendidos. Ajuda no autoconhecimento porque o indivíduo deve ser capaz de reconhecer em si seus sentimentos e necessidades. Essas são etapas importantíssimas do processo. ex: quando uma pessoa me chama a atenção em público e gera em mim um sentimento de constrangimento. eu percebo isso, já que tenho necessidade de ser reconhecida e valorizada, posso formular um pedido conforme os princípios da CNV: "gostaria que você me chamasse em particular quando tiver algo a conversar, porque me sinto envergonhada ao ser repreendida em público e, para mim, é importante ser valorizada".


Melina: Já ficou claro que comunicar é conectar. Como nos conectar com outras culturas num local offshore? Estamos falando do desafio da comunicação, naturalmente, pelas diferenças de idiomas e pela própria percepção de cada um, da multiculturalidade.


Danielle: O interessante da multiculturalidade é que traz riqueza para o ambiente de trabalho mas traz desafios também. Envolve diferenças de valores e crenças, estratégias de funcionamento diversas. Como a comunicação pode ajudar? Em primeiro lugar, pelo exercício da empatia, respeito às diferenças. Na condição humana sempre encontraremos algo que pode nos aproximar. Muitas vezes, é a paixão pelo futebol ou a culinária. Se mostrar interessado pela cultura do colega e ouvir, de fato, o que ele tem a dizer, pode ser uma oportunidade de reduzir distâncias.


Melina: Dado todo o cenário que vivemos, o que podemos fazer? Como favorecer o processo para nos movimentarmos em direção ao outro?


Danielle: Marshall diz para construirmos pontes e não muros. Cada um dá um passo e, assim, as distâncias diminuem. A qualidade das nossas relações será proporcionalmente boa conforme a dedicação que tivermos nos atos de comunicação.


Exemplo: Ao ser questionada sobre onde ficaria a farmácia mais próxima, eu posso, simplesmente, responder que não sei ou que fica na próxima esquina ou, ainda, que fica na esquina ao lado do mercado e verificar se a pessoa compreendeu. Eu respondo, tendo como parâmetro, o tanto de relação empática que eu procuro estabelecer. E está tudo certo.


Na CNV não há julgamento, certo e errado. Todos os sentimentos e necessidades são aceitas e validadas.


Melina: Dentro do princípio da CNV, o que falar de energia da voz? Isso tem a ver com o volume da voz?


Danielle: Na CNV não se fala em voz alta como um defeito, não tem juízo de valor, mas se isso incomodar o outro (porque é ele quem deve perceber como isso soa para ele), o ouvinte pode dizer que se sente desconfortável com aquele tom de voz. A ideia é trazer para si as observações de como aquela situação vai lhe afetar e não como o outro faz você se sentir. A responsabilidade é sua e isso é poderoso e transformador, mas é uma mudança de paradigma porque nos faz sair do papel de vítima e injustiçado.


Melina: Que dicas e sugestões são possíveis para os gestores? Vamos falar primeiro para o público offshore? E para quem está de casa, em home office, como agir?


Danielle: Para os gestores a dica de ouro é escutar, observar e se comunicar. Dar feedbacks assertivos será mais fácil conforme for feito este treino de escuta e observação. O que de fato ele espera dos colegas? Ele tem se certificado de estar sendo compreendido? Erros recorrentes devem ser investigados. O quanto faltou de competência técnica e o quanto houve falha de comunicação? Muitas pessoas podem ter dificuldades de serem assertivas porque têm medo do julgamento. Ser assertivo exige empatia, adaptabilidade, tolerância, sociabilidade.


Quem está em regime home office está lidando com um novo panorama. Convívio estreito com os familiares, adaptação às rotinas de casa e com filhos... Para os que participam de reuniões online, recomendo cuidado com a qualidade do contato em vídeo. Manter contato visual, se certificar de que a câmera esteja bem posicionada e o áudio esteja adequado. Cuidado com o volume que está usando no microfone para estar audível e confortável. Atentem para fechar os microfones em momentos que houver ruído no ambiente (tosse, latidos, choro de criança ou, ainda, conversas paralelas no telefone ou com algum familiar de casa).


As expressões faciais em vídeo devem ser ricas, isso gera engajamento do grupo. Vale para a equipe e gestores.


Melina: Ficou claro, para mim, que CNV é consciência e treino. Você pode nos ajudar, resumidamente, como praticar? Existem passos a seguir para nos atentarmos no nosso dia a dia?


Danielle: Gostaria de dar um exemplo de comunicação em ambiente familiar: um pai chega à casa, após uma longa permanência distante da família, e se deita em sua cama para descansar. Assim que os filhos chegam e o encontram em casa, saudosos, exigem sua atenção exclusiva. O pai fica triste porque também está saudoso, mas, naquele momento, ele precisa descansar, então, ele se sente culpado, mas aborrecido porque gostaria de ter um tempo para repousar. Se ele não “expressar/comunicar” esse desejo, possivelmente vai ficar irritado, vai dar pouca atenção aos filhos e o ambiente pode ainda ficar tenso e a situação desgastante, surgindo cobranças e mágoas.


Uma alternativa, com base na CNV, será ele falar: Eu fiquei muito tempo fora de casa (observação), sinto saudades (sentimento), gostaria muito de curtir vocês (necessidade de conexão, afeto), mas, preciso descansar (necessidade de relaxamento). Preciso de 1h de descanso e vamos jantar juntos (pedido).


Melina: O que diria como um comentário final?


Danielle: Quando eu não me comunico adequadamente o que me feriu, eu nego ao outro a oportunidade de reparação.

 
 
 

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